segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

OS CADERNOS DE KINDZU


        Eis que mais uma vez a companhia carioca Amok Teatro nos brinda com um significativo espetáculo. A última vez foi em 2016 com Salina – A Última Vértebra e agora em temporada relâmpago de apenas oito espetáculos é a vez de Os Cadernos de Kindzu, criado pelos encenadores Ana Teixeira e Stéphane Brodt, a partir da obra Terra Sonâmbula do moçambicano Mia Couto.
        Os Cadernos de Kindzu é encenação de caráter épico que narra a saga do rapaz Kindzu, sua relação com os pais (o pai está morto, mas lhe aparece) e com o adorável indiano Surendra, sua partida da terra natal devastada pela guerra, a descoberta de um navio e o encontro com Farida pela qual ele se apaixona e assume o encargo de partir em busca do filho da moça. Narrativas paralelas surgem ao longo de sua trajetória. Parte da peça é falada na língua nativa e em português lusitano.
        Em cenário limpo onde os atores permanecem mesmo quando não estão em ação veem-se os objetos de cena e os instrumentos que serão usados tanto na interpretação das belas canções compostas pelo grupo como também na criação de sons que ilustram as cenas (barulho do mar, movimentos dos atores). O desenho de luz de Renato Machado é responsável pelos belíssimos recortes de cena (uma jangada, uma cama, os diversos recintos onde se passam as ações e até um “toque” de mar no azulado do instrumento que reproduz o barulho das ondas).
        Thiago Catarino tem forte presença cênica e faz interpretação emocionada do perplexo protagonista, chegando às lágrimas em vários momentos da peça. Stéphane Brodt brilha na hilária cena em que é apresentado o indiano Surendra. Graciana Valladares tem força como a sofrida Farida e renderia mais se fosse menos melodramática e não gritasse tanto. Luciana Lopes está ótima como a prostituta cega Juliana, mas não convence tanto como a mãe como a narradora do estupro devido à entonação de voz extremamente artificial. Gustavo Damasceno, Sérgio Loureiro e Vanessa Dias (dona de bela voz) completam o elenco.
        A direção de Ana Teixeira e Stéphane Brodt é bastante criativa conjugando harmoniosamente elenco, cenário, figurino, iluminação e as belas canções de estilos indiano, africano e português que embalam todo o espetáculo. No meu modo de ver a encenação lucraria com alguns cortes na narrativa (saga de Farida é excessiva, conversa de Quintinho com o defunto) reduzindo as atuais duas horas de duração.
        Pela beleza da encenação e das músicas apresentadas e pelo tema tratado (imigrantes fugindo das atrocidades provocadas por guerras insanas) Os Cadernos de Kindzu é espetáculo que precisa ser visto.

        Não haverá apresentações no Carnaval. As últimas ocorrerão nos dias 15, 16, 17 e 18 de fevereiro sempre às 19h15. Na Caixa Cultural (Praça da Sé). Ingressos gratuitos.

05/02/2018


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