sexta-feira, 22 de maio de 2015

AULA MAGNA COM STÁLIN


 


         O cerceamento da liberdade de criação nas artes é matéria sempre pertinente e urgente a ser tratada pelo teatro. Um dos exemplos clássicos desse assunto é a maneira como a União Soviética por conta do realismo socialista manipulou os seus artistas e em especial na música, os compositores Prokofiev (1891-1953) e Shostakovich (1906-1975). As pressões sobre a vida e a obra de Shostakovich foram alvo do belíssimo espetáculo Opus nº7 dirigido por Dmitry Krymov, vindo da Rússia e apresentado no MITsp deste ano, onde a Mãe Russa, representada por um imenso boneco acalentava e ao mesmo tempo subjugava e humilhava o compositor.
         Aula Magna Com Stálin (1983) do dramaturgo britânico David Pownall trata da mesma questão ao mostrar uma suposta reunião em 1948 entre os dois compositores e os representantes do regime Stálin e seu comissário Andrei Jdanov, responsável pela produção cultural e pela propaganda stalinista. Transitando entre a comédia (o deboche nas figuras de Stálin e Jdanov) e o drama (a quase tragédia nas personagens de Prokofiev e Shostakovich) o autor acaba diluindo o impacto da trama. Há uma longa cena, que se pretende divertida, onde as quatro personagens tentam compor uma cantata baseada numa fábula russa. Além de nada acrescentar às motivações da peça ela a alonga e pior, altera quase como por milagre a maneira como os dois compositores se comportam durante todo o resto da ação, tornando-se “alegrinhos” e participantes espontâneos da proposta de Stálin.
         William Pereira é encenador que circula muito à vontade tanto pelo teatro como pela música (haja vista suas diversas incursões na ópera) e mescla com muita propriedade as duas artes nesta montagem usando a música quase como uma quinta personagem sempre presente em cena com as personagens as tocando ao piano para ilustrar momentos importantes da trama.
         O diretor carrega nas diferenças entre a farsa (representantes do regime) e o drama (os compositores) e o excesso de caricatura, principalmente na figura de Stálin dilui a denúncia que, creio eu, a peça pretende fazer. Stálin apresenta-se bonachão e suas ações tirânicas parecem ser justificadas pelo seu estado de embriaguês. Jairo Mattos representa de forma histriônica enfatizando as características aqui apontadas. Luis Damasceno (Jdanov) segue na mesma linha, mas consegue melhor equilíbrio para a personagem (autoritário com os compositores e pateticamente servil com o chefe Stálin). Os melhores momentos de interpretação ficam por conta de Felipe Folgosi (um frágil e assustado Shostakovich) e, principalmente, Carlos Palma numa composição brilhante como o acuado, mas resistente Prokofiev.
         A propositalmente pesada cenografia do espetáculo, assim como, a trilha sonora são assinadas pelo diretor. A dupla Fabio Namatame e Caetano Vilela que realizou belo trabalho em Dias de Vinho e Rosas repete aqui o feito nos figurinos e na iluminação, respectivamente.
         Num Brasil sempre à beira da perplexidade e com a censura (formal e informal) batendo à porta de quem procura fazer arte, Aula Magna com Stálin chega num momento propício devendo gerar discussões e reflexões a respeito do assunto.

         Em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil de quarta a sexta às 20h, até 03 de julho. CONFIRA.

 

22/05/2015

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