sábado, 6 de dezembro de 2014

RUTH E MARIA-BRAVAS GUERREIRAS

 

         Duas bravas guerreiras foram as responsáveis pela construção de dois teatros na cidade de São Paulo nos anos 1954 e 1964.
 
 
 

         Em 28 de outubro de 1954, Maria Della Costa (1926) inaugurava o seu amplo teatro construído num terreno da Rua Paim com a peça O Canto da Cotovia de Jean Anouilh, dirigida por Gianni Ratto. Bastante moderno para a época, foi cenário de espetáculos importantíssimos como a primeira montagem profissional de Bertolt Brecht em São Paulo (A Alma Boa de Set-Suan em 1958) e Depois da Queda de Arthur Miller em 1964, para citar apenas dois títulos. Nos anos 1960/1970 abrigou também espetáculos de outras companhias (Liberdade, Liberdade e Édipo Rei), além de shows antológicos de Elis Regina e Maria Bethânia (Rosa dos Ventos). Em 1978 foi adquirido pela Associação dos Produtores de Espetáculos Teatrais do Estado de São Paulo (Apetesp) com o objetivo (segundo a página da Associação) de “prestar maiores benefícios aos seus associados”. Hoje à beira dos 90 anos Maria Della Costa, ainda muito bela, está afastada do teatro.
 
 
 
 
 
         Dez anos depois, em 15 de dezembro de 1964, era a vez da sempre corajosa e empreendedora Ruth Escobar (1936) inaugurar o seu teatro na Rua dos Ingleses com A Ópera dos Três Vinténs de Brecht, dirigida pelo saudoso José Renato. A partir daí aquele espaço abrigou momentos fundamentais não só do teatro brasileiro (Roda Viva, 1ª Feira Paulista de Opinião, A Viagem, entre muitos outros) como também da resistência da classe teatral aos desmandos da ditadura militar o que pode ser verificado no livro de Rofran Fernandes com o sugestivo nome de Teatro Ruth Escobar-20 Anos de Resistência (Global Editora-1985). Ruth destruiu e reconstruiu seu espaço para abrigar da melhor maneira montagens antológicas como O Balcão (1969). Em 1997 o teatro também foi adquirido pela Apetesp. Ruth Escobar vive reclusa em São Paulo em avançado estado do mal de Alzheimer.
 
 

 

         Ícones do melhor teatro que se fez em São Paulo entre os anos 1950 e 1980, lamentavelmente esses teatros hoje estão destinados a “produtos” estritamente comerciais, o que se pode constatar por meio dos títulos de alguns dos espetáculos apresentados nos mesmos no decorrer de 2014:

         Teatro Maria Della Costa: República das Calcinhas/Manual da Bisca/Engolindo Sapo Para Um Dia Comer Perereca/Cenas de Doido: A Comédia Proibida/Gatomeu e Ratoleta.

         Teatro Ruth Escobar: Assalto Alto/Cura Ele Cura Ela/Quem Não Vê Cara, Não Vê Furacão/O Dia Em que Eu Comi a Pomba Gira/De Mala e Cuia no Trem do Riso/Homens no Divã/Casal TPM/Casal TPM 2-A Música da Nossa Vida/TPM-Terapia Para Mulheres/O Amante do Meu Marido/Nua na Plateia/Uma Família Muito Doida.

         Essas programações não fazem jus ao brilhante passado dos edifícios que as abrigam e muito menos às bravas guerreiras Maria Della Costa e Ruth Escobar que dão nome aos dois teatros.

         Teatros com esse passado e que levam o nome de mulheres desbravadoras que enaltecem e engrandecem a cena brasileira mereciam títulos mais importantes em seus cartazes.

         Resta a memória de quem pôde assistir nesses palcos a momentos fundamentais do teatro brasileiro.

         Esta é minha homenagem a Maria Della Costa, a Ruth Escobar e ao teatro brasileiro.

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