domingo, 24 de agosto de 2014

CONDOMÍNIO NOVA ERA



 
Divulgação

     Por gentileza de Victor Nóvoa, autor da peça, tive a oportunidade de ler o texto de Condomínio Nova Era dois dias antes de assistir à encenação de Rogério Tarifa em cartaz no Espaço Beta do Sesc Consolação. A prosa de Nóvoa literalmente tira poesia de escombros, seu linguajar é duro, às vezes cruel, mas não perde a ternura nem a compaixão pelas suas criaturas, compaixão esta que se materializa em Maria, a personagem melhor estruturada da trama. Sente-se falta da mesma consistência nas demais personagens que parecem não ter passado e só existir a partir da eminência da invasão: o prédio Nova Era habitado por 40 famílias e situado no centro de São Paulo está prestes a ser invadido pela truculência dos homens de fora e por meio de seis moradores acompanhamos o drama da desapropriação e do não ter para onde ir:  Seu João (o síndico), Dona Cleide (sua companheira), Raul, Jucilene, Marcos Mari e a sofrida Maria. Em tempos de reintegração de posse e da violência com que a polícia realiza esses atos esta peça é mais do que oportuna.
 
     A encenação de Rogério Tarifa rearranja o texto de Nóvoa eliminando algumas partes (toda a sequencia da ocultação do cadáver do enfermeiro que Raul matou e a partida de Dona Cleide), acrescentando outras (os relatos em torno do corpo de Maria, a entrevista do pivete na TV) e sabiamente colocando a personagem de Maria em primeiro plano, abrindo o espetáculo com o monólogo que originalmente está no meio da peça, fazendo-a testemunha de todas as cenas que ocorrem nos quartos dos outros elementos e encerrando a peça com o belíssimo texto final. Com seu comovente desempenho, a atriz Jussara Bracco faz jus à personagem que lhe coube. Os outros atores desempenham seus papéis a contento, porém, ressentem-se de certa falta de humanidade de seus personagens; quem melhor dribla este fato é Eduardo Mossri que interpreta Marcos Mari.
 
Foto de Lenise Pinheiro
 
     Como encenador, Rogério Tarifa caracteriza-se como aquele que explode/expande/explora o espaço cênico. Aqui ele consegue a proeza de transformar o exíguo (mesmo com a retirada da Sala de Leituras) Espaço Beta do Sesc Consolação em cinco ambientes onde ocorrem as ações da peça. Alguns desses ambientes remetem às instalações, tão ao gosto do encenador. Tarifa faz uso de uma bonita trilha sonora executada ao vivo pelo músico Zimbher, de vídeos  e de muitos objetos cênicos como TVs, bolinhas, terra, vinho. A dramática cena final mostra um embate digno de nota entre Jucilene (Helena Cardoso) e o homem de fora (Flavio Barollo) que se revela tão vulnerável quanto os despejados do Nova Era.
 
     Condomínio Nova Era é espetáculo obrigatório para aqueles que buscam no teatro reflexões sobre problemas contemporâneos como os despejos em função da especulação imobiliária, fato do qual, também o teatro tem sido vítima.
     Em cartaz no Sesc Consolação somente até o dia 04 de setembro, de segunda a quinta feira às 20horas.
 

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